Hoje assistindo pela quinta vez o filme do V de Vingança, me bateu uma vontade incontrolável de escrever sobre essa obra prima das HQs!
Um clássico dos quadrinhos a história se passa após um aparente hecatombe nuclear, a Inglaterra mergulha no caos. Depois de algum tempo, a ordem volta a se estabelecer, mas de forma ditatorial. Um governo fascista caça os direitos civis, impõe a censura e rechaça qualquer tentativa de oposição ao que impõe.
O medo profetizado no século XX, do estado vigiando o cidadão e tolhendo sua liberdade de expressão, se materializa nessa Inglaterra onde o estado tem olhos, ouvidos, nariz e dedos.
Eis que mesmo nesse regime totalitário/fascista uma voz se levanta e ousa proclamar a possibilidade de uma outra forma de vida, na qual não haja regras e leis arbitrárias, em que a liberdade e as individualidades sejam valorizadas e conduzam a um novo cenário, um personagem designado simplesmente "V" é o porta-voz dessa idéia.
Vitima de um dos abomináveis campos de concentração, "V" esteve no fundo do poço, e sem ter mais para onde cair, a única opção era se erguer.
Aos poucos, se faz claro que "V", mais que uma pessoa, representa um conceito, uma idéia.
Esta obra fabulosa já foi editada de três formas distintas: esta minissérie em cinco capítulos coloridos, pela Globo, uma versão encadernada da mesma editora e, pela Via Lettera em dois volumes em preto-e-branco.
E, apesar da ausência das cores, esta última edição traz a vantagem de apresentar um material extra no qual são explicadas várias das referencias usadas por Alan Moore e David Lloyd para compor a história.
Concebida para publicação em preto-e-branco, quando de sua publicação nos Estados Unidos a série recebeu cores produzidas pelo próprio Lloyd e Siobhan Dodd. E o resultado ficou maravilhoso, muito melhor que o original. Usando tons pastéis de forma suave, os artistas conseguiram um resultado tão bom, que é difícil imaginar que a obra não tenha sido criada nesse formato.
"V" defende a anarquia pura, a necessidade de destruir o atual e daí se criar um novo. Obviamente, uma sociedade reprimida por um estado totalitário responde rapidamente, se apegando ao conceito como tábua de salvação. Assim, os ideais anarquistas se multiplicam e encontra eco.
Mais do que uma mártir, um herói ou um revolucionário, "V" representa o ideal anarquista que prima pela ausência de domínio e pelo direito individual.
Ao passear por um mundo fascista fictício, onde todos os aspectos da vida cotidiana são censurados, inclusive os culturais, como livros, músicas, teatro, cinema etc, Alan Moore ao mesmo tempo evidencia a importância da cultura para a manutenção das liberdades individuais e alfineta a ignorância dos detentores do poder. Num sistema em que o estado vigia a liberdade, a pergunta nasce espontaneamente: quem vigia os vigilantes?
Um texto com predições sombrias e visão política clara sobre o papel do estado na vida do cidadão, na mesma linha do livro 1984, de George Orwell. Moore mostra um mundo no qual o estado vigia e oprime o cidadão.
Se o texto de Alan Moore é esplendido, o mesmo se pode dizer da arte de David Lloyd. O artista cria uma Londres noir, nostálgica e paradoxalmente futurista. O uso de luz e sombras em doses exatas proporciona ora a percepção do pessimismo reinante (e ai se vê uma cidade triste e sombria), ora um vislumbre da esperança observada, sobretudo, na face das pessoas.
Esta é, sem dúvida, uma das melhores HQs já escritas em todos os tempos. Feliz de quem tem essa jóia dos quadrinhos. Se você é um deles, parabéns. És alguém de posses e bom gosto!
V DE VINGANÇA (Editora Globo) - Minissérie em cinco edições
Autores: Alan Moore (História) e David Lloyd (arte).
Número de páginas: 64 páginas
Data de lançamento: 1989
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