Depois de vinte anos, o quadrinista norte-americano Bill Sienkiewicz finalmente resolveu explicar o que aconteceu com Big Numbers – seu projeto com o escritor Alan Moore que, de 12 edições, teve apenas duas lançadas em 1990.
Há várias versões sobre o motivo da série não ter ido para a frente. Em 2009, parte da edição 3, nunca publicada, apareceu na internet graças a um fã, o colecionador irlandês Pádraig Ó Méalóid – com autorização de Moore.
Méalóid enfim conseguiu conversar com Sienkiewicz sobre o fato. E o que conseguiu foi um longo relato do artista, em que ele explica as circunstâncias em torno da sua desistência do projeto.
Nele, Sienkiewicz desmente o rumor da dificuldade de trabalhar com os roteiros herméticos de Moore – o principal rumor era de que ele havia se revoltado com a falta de controle artístico sobre a obra. Sua principal dificuldade, diz, foi com os modelos que fotografava para os personagens de Big Numbers – todos baseados em pessoas da cidade de Westport, Connecticut, onde morava.
Além de não serem modelos profissionais, o que exigia um grande esforço de direção da parte do artista, vários dos fotografados queriam saber como sua imagem seria utilizada – “um carinhoso senhor indiano, que posou para o papel de dono da loja e aficionado em maquetes de trem, queria ter certeza de que não estava sendo representado de alguma forma contrária a suas crenças religiosas; o pai negro queria ser representado com dignidade; (...) havia os pais que, compreensivelmente, não estavam nem um pouco felizes com a ideia de um quadrinista vagabundo maluco tirando fotos de seus anjinhos preparando coquetéis molotov”, relembra.
Em meio a isso, dois dos modelos que posavam para a série faleceram – um deles, grande amigo de Sienkiewicz. Para terminar, a modelo para a personagem principal da série, Christine, mudou-se para a Alemanha.
O artista coloca bastante ênfase nesta dificuldade com os modelos, mas também fala de conflitos com o estilo de desenho/pintura/interferências que ele próprio havia estabelecido para a série, além da “cabeça-quente da juventude” e, mencionado rapidamente, o fato de estar separando-se da esposa à época.
Al Columbia, então assistente de Sienkiewicz, ficou com a tarefa de dar sequência à série. Não se sabe ao certo o que aconteceu com esta ideia – Sienkiewicz apenas confirma que eles tiveram uma briga séria, e Columbia já declarou que, apesar de ter recebido pelo trabalho, resolveu destruir as páginas que havia feito e abandonou o projeto. A partir daí, Alan Moore e a editora Tundra – que publicava a série junto à editora do próprio Moore, a Mad Love – decidiram não dar continuidade a Big Numbers.
“Sinceramente, não há semana em que eu não pense em terminar o que comecei, em ligar para o Alan e dizer ‘Oi, é um adulto. E aí? Vamos botar pra quebrar!’ Entendo como ele ficou desapontado, embora não tenha dúvida de que já tenha superado. E tenha ficado até mais brilhante, se é que isso é possível. Já pedi desculpas ao Alan pessoalmente, bem como a outras pessoas. E peço desculpas a vocês – leitores”, escreve Sienkiewicz. “Sei o que seria necessário para tornar Big Numbers completa uma realidade. Mas, aconteça o que acontecer, esta será a minha Teoria do Caos”, conclui.
Baseada na Teoria do Caos, Big Numbers mostraria as repercussões da instalação de um shopping center em uma pequena cidade britânica, através da visão de dezenas de personagens. Moore tinha em seu escritório um pôster gigante detalhando o que aconteceria com cada personagem ao longo da complexa série. A série, por enquanto, continua fazendo aniversários como maior obra-prima não-conhecida dos quadrinhos.
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