Mais obras nas livrarias fez acordar alguns setores. Um deles foi a chamada grande imprensa.
Jornais que costumavam ignorar os quadrinhos passaram a tê-los como pauta.
Na dificuldade de entender a história gráfica, com temática adulta, na forma de quadrinhos, houve ensaios, bem mais de um, de ver no produto uma obra literária.
Essa visão ainda está no ar e reaparece de quando em quando, principalmente em entrevistas feitas com quadrinistas e pesquisadores. Bem-intencionada, é fruto de desinformação.
As idas dos quadrinhos para o cinema também ajudaram. Histórias ignoradas por parte da imprensa ganharam destaque após irem para a tela grande. Watchmen é apenas um caso.
Quem também acordou para o tema foi a academia. Mais pesquisadores conseguiram inserir seus estudos em universidades de todo o país. Muitos ainda enfrentando preconceito.
Números da Universidade de São Paulo ajudam a dar uma dimensão disso.
A quantidade de mestrados e doutorados sobre quadrinhos na instituição, nesta década, foi mais que o dobro de tudo o que se estudou na área na USP durante todo o século 20.
A percepção que se tem é que outros cursos de pós-graduação também passam pelo mesmo processo. Trabalhos de Conclusão de Curso também. Os livros idem.
O jornalista Gonçalo Junior, em particular, elevou a abordagem sobre os quadrinhos a um novo patamar com o livro "Guerra dos Gibis", lançado pela Companhia das Letras.
Outro discurso importado do século passado era sobre o papel da internet. Muito se dizia que a rede mundial iria revolucionar o mercado e a linguagem dos quadrinhos.
A linguagem, um pouco. O mercado, com certeza, a começar pelas vendas de obras via computador e a redução da distância entre autor e editora, encurtada pelo e-mail.
A tecnologia também ajudou a dar uma nova cara à produção independente. Ficou graficamente mais profissional, feita por gente que não espera e faz acontecer, com bons resultados.
Na internet, após tentativas de mesclar quadrinhos com animações, algo na pauta da primeira metade da década, os autores tenderam a voltar aos formatos tradicionais em papel.
Ter um blog para reproduzir trabalhos ou para apresentar produção inédita tornou-se regra entre os quadrinistas. A internet se tornou uma enorme janela, pronta a ser aberta.
O que este ano e o passado parecem sinalizar é que a ida para o computador retorna na publicação em papel. É como um bumerangue. Arremessado, volta ao ponto de origem.
Orlandeli, João Montanaro - descoberto na internet e hoje chargista da "Folha de S.Paulo" -, Estevão Ribeiro e, neste mês, Rafael Sica são alguns exemplos. Relançaram-se em álbum.
Outra tendência parece ser a de priorizar formatos mais curtos na internet, talvez reflexo da leitura mais rápida, acentuada em suportes como celular ou em redes como o Twitter.
As tiras tendem a ser as mais exploradas. Em particular as de humor. As melhores, hoje, estão na internet. Mesmo as dos jornais são depois reproduzidas na rede. Mudança radical.
Os anos finais desta década dão outro sinal: o de procurar atingir outros públicos leitores, comportamento que a reedição de Sandman pela Conrad já havia explorado e iniciado.
Ter uma mesa de quadrinhos na Festa Literária de Paraty e nela receber Robert Crumb são apenas dois exemplos. Enxerga-se no leitor de livros um leitor de quadrinhos em potencial.
A presença dos quadrinhos nas escolas é outro indício. Constrói-se hoje um novo leitor de quadrinhos. Os frutos disso, se houver, serão percebidos nesta próxima década.
Mas já há um bom resultado: o menino paulista, que venceu nesta semana da Olimpíada de Língua Portuguesa, feita em todo o país.
Fábio venceu com um poema. Ele diz ter criado gosto pela leitura com quadrinhos.
De forma simples, a premiação dá uma resposta tardia, e concreta, a todos os que ainda resistem a enxergar nos quadrinhos uma forma válida de leitura.
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